Dia do Professor: brasileiras que ensinam no Japão falam sobre vocação e o poder da educação

Tóquio – O Dia do Professor é celebrado em 15 de outubro, data que homenageia uma das profissões mais respeitadas do mundo, ao lado de médicos e bombeiros. Mesmo diante dos inúmeros desafios da profissão, os professores seguem firmes em sua missão de formar as próximas gerações — futuros médicos, bombeiros, economistas e tantos outros profissionais que farão a diferença na sociedade.
A importância da educação no Brasil é reconhecida desde o período imperial. Em 15 de outubro de 1827, Dom Pedro I promulgou uma lei sobre o Ensino Elementar, considerada um marco no desenvolvimento educacional do Brasil Colônia. O texto definiu os objetivos de estudo dos alunos, determinou que todas as cidades deveriam ter Escolas de Primeiras Letras — equivalente ao atual Ensino Fundamental — e até estipulou o salário dos professores.
Somente em 1963, no governo de João Goulart, a data foi oficialmente instituída como Dia do Professor, em referência ao decreto imperial. Já o Dia Mundial do Professor é comemorado em 5 de outubro, conforme decisão da Unesco.
Ensinar como forma de gratidão

A professora Vanessa de Araújo Melo Nishimura, 39 anos, vive em Minakuchi (Shiga) e há oito anos leciona no Colégio Latino, em Higashiomi (Shiga), para alunos do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental, com idades entre 6 e 9 anos.
No Brasil, atuou por três anos como professora em uma escola particular em Brasília (DF). Seu desejo de ensinar nasceu ainda aos 13 anos, quando atuava em uma denominação religiosa. “Na época, eu me encantei em poder lidar com as crianças e tive professores que me inspiraram a cursar Pedagogia, em 2016”, relembra.
Para dar o exemplo aos seus alunos e para oferecer o melhor para eles, Vanessa não parou de estudar. Ela conquistou pós-graduações, como em Psicopedagogia Institucional, Neuropsicopedagogia, Docência do ensino superior e ainda Intervenção ABA (Análise do Comportamento Aplicado) para Autismo e Deficiência Intelectual.
Dar aulas em uma escola brasileira no Japão faz Vanessa sentir-se próxima de suas origens. “Trabalhar com as crianças me faz sentir como se estivesse no Brasil. É gratificante lidar com compatriotas mirins; poder oferecer algo para eles me dá a sensação de dever cumprido”, conta.
Vanessa lembra com carinho dos alunos de Brasília que ainda buscam seus caminhos profissionais. Um deles, que frequentava suas aulas na igreja, hoje integra a Força Aérea Brasileira. “Não tivemos mais contato, mas soube pelas redes sociais. Fico feliz, pois ele acreditou em si mesmo. O papel do professor vai além de ensinar conteúdos; é mostrar aos alunos que são capazes de sonhar e realizar”, diz.
Ela acrescenta: “Na minha adolescência, eu já acreditava que a educação vai além do conhecimento. Ela é capaz de transformar e melhorar vidas.”
Paixão que começou aos cinco anos

Jéssica da Rocha Sakamoto, 29 anos, leciona no Colégio Santos Dumont, em Konan, e conta que decidiu seguir o magistério aos 14 anos, em Cambé, região de Londrina (PR). “Na adolescência, eu já sabia que queria ser professora. Comecei como auxiliar e, aos 18 anos, me tornei regente, dando aula para crianças de 4 a 5 anos”, recorda.
Ela é formada em Magistério e licenciada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Além disso, é pós-graduada em Psicologia Escolar e Educacional, formação que amplia sua atuação pedagógica com um olhar atento aos aspectos emocionais e cognitivos do processo de aprendizagem.
Com ampla experiência na área educacional, a professora já trabalhou com Educação de Jovens e Adultos (EJA), Educação Especial, Educação Infantil e Ensino Fundamental, desenvolvendo um trabalho pautado na sensibilidade, no compromisso e na valorização do potencial de cada aluno.
Hoje ela atua também como coordenadora pedagógica, função em que exerce liderança e orientação às equipes docentes, promovendo práticas pedagógicas significativas e o fortalecimento do vínculo entre escola, família e comunidade.
“A diferença de lecionar aqui é grande. No Brasil, trabalhamos por turnos; no Japão, os professores passam mais tempo com as crianças, acompanhando o ritmo de trabalho dos pais nas fábricas”, observa.
Jéssica diz que o sonho de ensinar, na verdade, vem desde os cinco anos. “Gosto de ensinar e consigo perceber as dificuldades dos alunos, adaptando minha abordagem para que aprendam de verdade”, afirma. Fora da sala de aula, também é professora de balé clássico, prática que iniciou aos 14 anos.
“Ser professora é gratificante. Sem clichês, meu coração transborda quando vejo que as crianças compreenderam o que planejei. Nessas horas, comemoro com alegria”, diz. Recentemente, um ex-aluno, hoje com 15 anos, procurou-a para contar seus progressos e mencionar que integra uma escolinha de futebol. “O trabalho do professor não se limita a ensinar letras e números. Ele também forma valores e cidadãos para a sociedade”, conclui.
Dedicação e inspiração familiar

A vontade de ensinar fez Cristina Haruko Yoshiy Olivares, 59 anos, enfrentar muitas etapas até se firmar na profissão. No Brasil, atuava como professora substituta, mas, por falta de oportunidades, trabalhou como auxiliar em um hospital em Bilac (SP).
Ao mudar-se para o Japão há 30 anos, iniciou uma nova fase, trabalhando em uma fábrica de paletes em Nagahama (Shiga). Em 2001, retomou sua carreira docente e, desde 2012, leciona no Colégio Sant’Ana.
“Dou aula para alunos do pré ao ensino médio, entre 5 e 17 anos. Um dos desafios é a constante atualização. O professor precisa se renovar para manter o respeito dos alunos e colegas”, comenta.
Cristina estudou na Universidade Católica Virtual e formou-se em Pedagogia pela Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), em parceria com a Universidade de Tokai. Também concluiu MBA em Gestão Escolar pela Universidade de São Paulo e fez pós-graduação em História e Geografia, e cursa Psicanálise, que a ajuda a lidar melhor com questões pessoais e com os alunos. “Cada criança tem um interesse diferente. É essencial saber conversar e ter repertório para acompanhar o ritmo deles”, afirma.
Para ela, o papel do professor é o de mediador do conhecimento e da formação pessoal. “O professor é um agente transformador. Na fábrica, você produz uma peça e não vê o resultado. Já na educação, vê o progresso dos alunos. Certa vez, dei um livro para leitura e uma aluna gostou tanto que quis ler toda a coleção. Isso me deixou muito feliz”, conta.
Cristina destaca que o amor pela educação influenciou também seus filhos. “Tenho três filhos. Um trabalha na Embaixada do Japão em Brasília, na área econômica; outra formou-se em Educação Física e atua no setor de negócios; e a terceira é professora na Universidade de Tóquio", diz, reconhecendo que a educação continua como o maior instrumento de transformação que existe.
Carga de trabalho dos professores no Japão
Entre 55 países da OCDE, o Japão apresenta uma das jornadas de trabalho mais longas para professores. A média é de 52,1 horas semanais no shogakko (ensino primário) e 55,1 horas no chugakko (ensino fundamental II), segundo a Pesquisa Internacional de Ensino e Aprendizagem (TALIS 2024), publicada pela Jiji Press.
Desde 2018, os professores japoneses lideram o ranking das jornadas mais extensas. Mesmo com propostas de reforma, continuam sobrecarregados em comparação com colegas de outros países.
O Ministério da Educação, Cultura, Esportes, Ciência e Tecnologia (MEXT) implementou medidas como limitação de horas extras e terceirização de atividades extracurriculares. Apesar de algum progresso, a própria estrutura da educação japonesa — que valoriza o equilíbrio entre conhecimento, virtude e saúde — ainda exige dedicação intensa.
A pesquisa revelou também que 40,7% dos diretores citaram a falta de professores como o principal obstáculo à educação de alta qualidade, mais que o dobro do índice anterior (19,2%). O dado reforça a urgência de atrair e valorizar mais profissionais para a área.
Foto: Canva































