Vila com 1,8 mil moradores enfrenta superlotação com 480 mil turistas por ano em Kyoto

Kyoto – Embora o Japão seja um dos destinos preferidos de visitantes estrangeiros, algumas localidades enfrentam as consequências do turismo excessivo. É o caso da vila de Ine, em Kyoto, que abriga cerca de 1.800 moradores, mas que, no ano passado, recebeu 480 mil visitantes — o equivalente a 270 vezes sua população local.
Ine é uma vila tranquila, situada a aproximadamente duas horas de carro do centro de Kyoto, conhecida por sua paisagem preservada desde a era Edo (1603–1868). Também chamada de “Veneza do Japão”, essa aparência característica vem sendo mantida com cuidado pelos moradores. No entanto, a preocupação atual dos residentes é o aumento expressivo da movimentação turística, informou a emissora NTV.
A vila é classificada como Área de Preservação de Conjuntos Arquitetônicos Tradicionais Importantes, com cerca de 230 casas de madeira alinhadas à beira-mar. Os andares térreos dessas construções funcionam como garagens para barcos, o que dá a impressão de que as casas flutuam sobre a água.
Os moradores seguem suas rotinas, mas têm enfrentado dois problemas crescentes: o aumento repentino de turistas e o comportamento incômodo de parte deles, o que gerou reclamações e levou a Associação de Turismo local a publicar um comunicado:
“As casas de Ine no Funaya são propriedades privadas e locais de moradia dos residentes. Não são pontos turísticos nem locais históricos abertos ao público.”
Reclamações por invasões
A vila é acessível apenas de carro, o que também tem causado engarrafamentos intensos. Moradores relatam que, durante feriados prolongados, “não conseguem sair de casa de carro”. Como as ruas são estreitas, o risco de acidentes aumenta.
Há relatos de turistas que entram em propriedades privadas sem autorização, comem e bebem em áreas residenciais e fazem barulho excessivo, desrespeitando o cotidiano dos habitantes.
O governo local implementou medidas para organizar o trânsito, ampliou áreas de estacionamento e passou a distribuir folhetos com orientações de boas práticas aos visitantes.
Otimismo
Nem todos os moradores, porém, encaram a situação de forma negativa. Alguns veem aspectos positivos no aumento do turismo.
Um residente comentou que, antes da chegada massiva de visitantes, muitas lojas estavam fechando e a vila se tornava cada vez mais silenciosa.
“Com a vinda de turistas, alguns comércios reabriram. Jovens passaram a administrar esses estabelecimentos, tornando o ambiente mais animado”, relatou.
Cobrança de taxa
Para o professor associado Shutarō Takeda, da Escola de Pós-Graduação da Universidade Keio, o Japão é tolerante demais com o excesso de turismo.
“Veneza, na Itália, começou a cobrar uma taxa de entrada em 2024 e aplica multas a infratores. Se Ine cobrasse, por exemplo, 1.000 ienes por visitante, arrecadaria cerca de 500 milhões de ienes. Com isso, seria possível melhorar os serviços públicos locais”, afirmou.
Takeda lembrou que Kyoto chegou a ficar próxima da falência, mas se recuperou após a criação da taxa de hospedagem.
“O Japão inteiro precisa adotar esse tipo de medida. É fundamental criar um sistema em que o país realmente se beneficie do turismo internacional. Se a situação atual continuar — com apenas alguns se beneficiando em uma vila de 1.800 habitantes — isso pode até causar divisões internas na comunidade.”
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